Back to The Beginning: quando o heavy metal voltou pra casa em forma de celebração monumental

 

No último sábado, 5 de julho, o Villa Park, em Birmingham, virou altar, memória viva e palco de um dos maiores encontros da história recente do rock. O Back to The Beginning reuniu o Black Sabbath em sua formação clássica, nomes pesados do metal e lendas contemporâneas num dia que foi, ao mesmo tempo, homenagem e despedida. Um tributo à era dourada de Ozzy Osbourne e à força bruta e transformadora do heavy metal.

Créditos: Ross Halfin / @rosshalfin

Com apresentação de Jason Momoa e ingressos esgotados em apenas 16 minutos (foram 150 mil na fila pra 45 mil lugares!), o evento teve uma única missão: celebrar um legado. E fez isso com tudo o que se espera de um ritual desse porte: peso, lágrimas, união, riffs e propósito. Toda a arrecadação foi destinada a instituições como Cure Parkinson’s, Birmingham Children’s Hospital e Acorn Children’s Hospice.

A estrutura: um palco girando memórias

Sob a direção musical de Tom Morello, que definiu o show como o "Freddie Mercury Tribute" do metal, o espetáculo trouxe uma produção que impressionava tanto quanto o line-up. O palco giratório numa referência direta ao Live Aid de 1985, foi o coração pulsante da dinâmica fluida entre os 13 grupos, 3 artistas solo e 2 supergrupos que se revezaram até o toque de recolher às 23h.

Entre uma banda e outra, foram exibidos vídeos de artistas que não puderam estar presentes: Elton John, Dolly Parton, AC/DC, Def Leppard, Marilyn Manson, Billy Idol. Teve até Jack Black, em vídeo, detonando “Mr. Crowley”. E um duelo insano de baterias, ao som de Symptom of the Universe, reuniu Travis Barker, Danny Carey e Chad Smith numa jam que beirou o surreal.

Créditos: AFP

Line-up: uma constelação em carne, osso e distorção

Cada banda teve entre 20 e 30 minutos de palco, tempo suficiente pra mostrar o que sabem fazer de melhor e ainda prestar tributo ao Sabbath e a Ozzy. Mastodon, Rival Sons, Anthrax, Halestorm e Lamb of God abriram o caminho até o primeiro supergrupo da noite, que contava com Nuno Bettencourt, Lzzy Hale, Jake E. Lee e David Draiman.

O Alice in Chains trouxe peso e nostalgia com Man in the Box e Would?, além de releituras sombrias do Sabbath. O Gojira foi técnica pura: riffs milimetricamente encaixados e participação emocionante da mezzo-soprano Marina Viotti em Mea Culpa, numa mistura rara de brutalidade e lirismo.

Na sequência, o Villa Park virou um templo do mosh pit com Pantera, Tool, Slayer, Guns N’ Roses e Metallica. Cada uma despejando seus maiores clássicos e recriando versões poderosas de faixas do Sabbath.

Um segundo supergrupo, com Billy Corgan, Steven Tyler, Ronnie Wood e Tom Morello, entregou uma sequência absurda de Train Kept a Rollin’, Whole Lotta Love e Breaking the Law, uma verdadeira carta de amor ao rock de várias gerações.

Ozzy: o rei no centro do próprio reino

Aos 76 anos, vivendo com Parkinson, Ozzy Osbourne foi o coração de tudo. Sentado numa cadeira ornamentada com caveiras, trouxe seu repertório solo com vulnerabilidade e potência emocional. Um ícone frágil e ao mesmo tempo gigante. Foi impossível não se emocionar.

E então veio o desfecho: War Pigs, Iron Man, N.I.B. e Paranoid com a formação clássica do Black Sabbath. Era como se o tempo tivesse congelado. Como se toda a história do metal tivesse voltado pra onde começou. E lá terminasse. Em casa.

E no meio dos titãs... Yungblud!

Talvez o momento mais inesperadamente arrebatador da noite tenha vindo de um artista que, a princípio, não parecia jogar no mesmo campo de Slayer ou Metallica. Mas ali estava Yungblud, subindo ao palco com Nuno Bettencourt na guitarra e cantando Changes, do Sabbath.

Ele não precisava de mais nada. Voz crua, presença magnética, entrega total. Em segundos, tinha o estádio inteiro cantando junto, num coro catártico que pareceu parar o tempo. Sharon Osbourne, emocionada, disse que a performance a tocou profundamente e que Yungblud virou parte da família. Ele dedicou a música ao jogador Diogo Jota, que faleceu dias antes em um trágico acidente de carro.

Um artista em transição, num palco de transformação

A escolha de Changes não foi por acaso. Yungblud está em uma nova fase, refletida no álbum Idols, lançado em junho, em que flerta com o britpop, fala de identidade, pertencimento, vulnerabilidade. Tudo isso reverberou no palco do Villa Park.

Essa nova maturidade artística já tinha dado as caras em shows menores, como o set intimista no Scala, em Londres, com canções inéditas como Hello Heaven, Hello, Lovesick Lullaby e Zombie. Mas foi ali, ao vivo, num evento que celebrava legados, que Yungblud cravou o seu.

E no fim, talvez seja essa a grande força de Back to The Beginning: lembrar que o metal é sobre resistência, sobre transformação. E sobre acolher quem vem depois.

 


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